quinta-feira, 30 de julho de 2009

Doce Pecado

Dia perfeito. Meu filme preferido iria estrear mais uma de suas continuações. Combinei de ir ao cinema com uma amiga, a Marcela. Chegar cedo, enfrentar toda aquela fila e ser uma das primeiras a contemplar essa estreia. Minha ansiedade era tanta que nem consegui dormir direito. Aproveitei a noite em claro para escolher o look que eu iria vestir. Uma calça jeans nova que havia comprado na semana anterior, uma blusa rosa com uma alça super fofa e um salto preto super alto. Falei com Marcela no msn e ela disse que iria me esperar cedo na fila do cinema com seu namorado. O meu odiava aquele filme e preferia ficar em casa fazendo nada. Custava ele provar que gostava de mim de verdade e fazer essa força de me acompanhar? Enfim. Estava solteira naquela quarta-feira. Depois de enfrentar fila, gritar e me descabelar feito uma louca, finalmente entrei na sessão. Caramba, o filme foi perfeito. Marcela não assistiu nada. Ficou o tempo inteiro provando a saliva de Pablo e confesso que fiquei com um pouquinho de raiva por não poder fazer isso com André, naquele momento. Ao sair da sala, eis que me surge um menino alto, de mais ou menos 20 anos, barba por fazer, cabelo bagunçado, perguntando displicentemente o que eu havia achado do filme. Senti-me íntima e comentei horrores sobre a história. Fernando me olhava nos olhos e parecia acompanhar com atenção cada palavra dita por mim. Fomos tomar sorvete e ele me confessou uma coisa. Disse que já vinha me fitando desde a hora em que cheguei ao cinema e que não sairia dali se não fizesse uma coisa.
 
Na cabeça de toda garota de 17 anos, só passa uma coisa em um momento desses: “Esse garoto vai me beijar”. Que nada. Fernando puxou um colar do bolso e colocou em meu pescoço. Achei super estranho aquilo, mas foi muito melhor do que trair meu namorado. Eu queria ver como o colar havia ficado e pedi que Fernando me acompanhasse até o banheiro. Fomos lá e eu senti algo estranho em meu corpo. O colar havia ficado maravilhoso, mas meu corpo parecia estar diferente. Meus seios haviam aumentado, meu cabelo estava mais liso e eu sentia uma confiança tremenda em mim mesma. O que aquele garoto havia feito comigo? Não sabia explicar, mas eu precisava ter aquele cara imediatamente do meu lado. Sentia-me na necessidade de me entregar inteira a ele. Retoquei a maquiagem, saí do banheiro e lá estava ele me esperando, com aquele olho claro me olhando dos pés a cabeça. “Você está linda. Acompanha-me?!” “Claro, amor. Só se eu fosse a mulher mais burra da face da Terra para não acompanhá-lo.” Ele riu. Pegou em meus braços e sussurrou em meu ouvido tudo o que eu precisava ouvir naquela noite: “Você agora é toda minha” Era a única certeza que eu tinha. Marcela havia me ligado e eu a ignorei, dizendo que não poderia ficar mais. Fomos embora daquele aglomerado. Éramos só nós dois dentro daquele belo carro preto. Eu me sentia fraca, dominada e ele sempre com aquele olhar sedutor, me despindo com os olhos. Chegamos à sua casa. Sem acender as luzes, ele disse que tinha uma surpresinha. Trouxe-me um bombom e ordenou que eu o colocasse na boca. Obedeci imediatamente e senti o melhor gosto que já havia sentido em toda minha vida. Fernando havia me enfeitiçado e agora eu era sua escrava. Sem enxergar nada, comecei a me despir e pedir que ele me beijasse. E o colar sempre ali, me dizendo que aquela era a hora certa.
 
Fernando tinha o beijo mais gostoso que eu já havia experimentado e, com certeza, seria o homem perfeito para me fazer mulher. Quando estava só de calcinha, senti mãos frias passeando pelo meu corpo, uma boca beijando minha nuca e sussurrando as palavras mais sedutoras já ditas. Meus seios eriçavam. Meu corpo estava arrepiado e eu pronta para me entregar àquele garoto desconhecido, que gostava de tudo o que eu gostava e sabia de todos os meus pensamentos, inclusive de meus desejos mais íntimos. Seu sexo era gostoso de pegar. Não sabia ao certo o seu tamanho, mas ele se encaixava perfeitamente ao meu. Era como se tivesse sido feito pra mim. De repente, senti meu pescoço ficar tenso e mais arrepiado. Havia sido mordida por um vampiro e não podia reagir por causa do colar, que me aprisionava. E eu gozava feito uma vadia. Transamos em todos os cômodos da casa. Chamava-o de ‘meu mestre’ e ele retribuía com agradáveis mordidas em meu corpo. Esqueci que tinha amigos, escola e família. Acordei perturbada com a luz do sol e em casa. Era dia da estreia do meu filme preferido, justamente um filme de vampiros. Pelo menos eu sabia o que vestir: a mesma calça jeans que havia comprado na semana anterior, o salto preto que me deixava sexy e aquela blusa rosa com decote. E pouco me importava se agora eu era uma vampira ou não. O importante era que aquele dia seria perfeito. E só…

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Meu primeiro porre

O som antigo de Lobão ecoava por todo aquele local escuro e fétido. Todas as almas daquele lugar pareciam alcançar um estágio depois do transcendental. Era um barulho alto, um cheiro de bebida insuportável e a ardente vontade de se permitir ir além. Seis lances de escada pareciam separar a Terra do Inferno. E as luzes de um banheiro apertado anunciavam que ali algo de muito estranho aconteceria.
 
Uma janela entreaberta era a única alternativa para quem desejasse ver a noite. Aliás, como seria aquilo pela manhã? Será que todos os bichos se escondem e dão espaço à limpeza ou limpeza é o último substantivo pensável naquele plano? Eu não sei. Só sei que naquela sexta tudo que eu desejava era um gole do conhaque mais ardente. Eu precisava sanar toda a minha agonia, todos os meus escrúpulos de adolescente em um copo pequeno de bebida estranha.
 
Eu precisava também de uma mulher. Não uma mulher estranha que eu pudesse encontrar ali. Eu precisava de uma mulher estranha que me encontrasse naquele lugar e me fizesse perceber o quão bom e prazeroso era estar naquele Inferno. Eu precisava de pessoas. Não pessoas estranhas que eu encontrasse ali, mas sim pessoas estranhas que me levassem até aquele lugar e pudessem dividir comigo aquela agonia.
 
O primeiro gole era estranho, tão quanto aquele lugar. Sensações de desconhecido e reconhecido entrelaçadas, gosto amargo de algo inominável, risos e caretas. As línguas que insistiam em se tocar, o corpo que insistia em relaxar, a música que insistia em dominar a mente. Era tudo o que eu sempre quis, de um jeito que eu não sabia como seria.
 
O segundo era mais ameno. A sensação de tranquilidade já tomava conta de todo o meu ser. Era uma paz diferente, a paz de estar no Inferno. Os corpos começaram a se tocar, os olhos fitavam partes precisas daquela mulher e a vontade de ir além daquele além era crescente. O banheiro. Munido de toda a proteção aparente e com uma coragem que só a bebida pode dar, lá se foi aquele casal, não sem antes beber mais uma e tragar mais um outro. O empurrão na parede, a mordida no pescoço, as palavras sacanas e o fim de um tabu.
 
O tempo passava e tudo o que eu consigo me lembrar é que eu não me lembro de mais nada. Pessoas pareciam dar tchau, pareciam reclamar que já era tarde, pareciam me ajudar a descer do carro, pareciam me dar sermões e me jogarem debaixo do chuveiro, pareciam adormecer… O outro dia era consequencia. Nada mais importava. Era o meu primeiro porre, a minha primeira sensação de não ser aceito no céu e a minha primeira paz de espírito. Tudo ao som de um rock psicodélico, ejaculado na velocidade terrível da queda.

sábado, 18 de julho de 2009

Paralelas

O dócil menino era um santo. Vivia nos cantos a reclamar dos percalços e da solidão, quase sempre cheio de gente por perto. Era insatisfeito. Tinha 17 anos e já vivia como se fossem 117. Era sempre muito paciente. Passava uma segurança insegura de dar inveja a qualquer vigia ou coisa assim. Estava sempre disposto a ajudar, mesmo que soubesse que depois não seria ajudado, que voltaria à solidão e que seria só mais um dentre os milhões de só mais uns. Mas se conseguissem zangá-lo...

A doce menina era louca. Vivia intensamente como se o dia fosse acabar antes das 24 horas usuais. Andava por toda a cidade distribuindo alegria e sorrisos sinceros por onde passava. Apesar de namorar, de ter um milhão de amigos e de ser a melhor em tudo o que fazia, achava que faltava alguma coisa. Era insatisfeita. Tinha 117 anos e vivia como se tivesse 17. Não era muito paciente, não ajudava ninguém e vivia trancada em seu mundinho, em seu quarto, em sua máquina de escrever moderna.

Os dois nunca se encontraram. Viveram anos e anos de agonia. Um dia, em um sonho dela, ele apareceu, na sombra da saída do cinema, com uma gente estranha do lado. Nem a olhou. Ele acordou. Sentiu que tinha vivido a noite mais bem vivida de toda sua vida. E só. Apaixonado e inconstante, como eu...

Marcos Lima

domingo, 12 de julho de 2009

Mil e uma primaveras

Eu nunca fui muito de ir à aniversários. Carrego comigo duas hipóteses: ou o aniversariante esquece de me convidar ou realmente ele não vai com minha cara. Já perdi as contas de quantas comemorações eu deixei de ir simplesmente porque não fui convidado. Cara, e de amigos tão próximos… Mas vai entender. Pelo menos aqueles em que fui me renderam boas histórias e que gostaria de compartilhar, agora, com vocês.
 
Pra ser sincero, o último aniversário com bolo e tudo mais em que estive presente foi no ano passado, nos 15 anos de Juliana. Eu poderia falar uma porção de coisas da festa, mas vou me reservar a duas que me marcaram como ser humano crasso que sou. Alguém aí já terminou o namoro em um dia e no mesmo dia foi flertar com outra pessoa? Nesse dia, eu fiz isso. Tinha terminado um namoro conturbado e queria ficar com uma amiga da aniversariante que – adivinhem – estava de salto. Dia desses eu tento explicar melhor esse meu fetiche por salto alto, mas tudo bem… Resumindo, ela tinha um fica e eu acabei dançando! E por falar em dançar, a festa tinha uma baladinha (que não estava lá essas coisas, confesso) e acabaram me convidando pra “balançar o esqueleto”. Mas eu preferi ir, com um outro amigo, buscar salgadinhos pras meninas. Sento, coloco uns 300 salgadinhos em cima da mesa, olho pro lado e todo mundo havia sumido. Quando a tia da aniversariante surge do nada e manda a frase da noite: “Dançar que é bom ninguém quer, mas comer…” Ok, esse parágrafo ficou gigante; fim do aniversário de Juliana.
 
E como me esquecer do melhor aniversário em que já fui? Foi tudo tão perfeito. E não foi pelo simples fato de ser um sábado à noite. Diria que o conjunto da obra foi o seu maior diferencial. Não foi uma festa chique; os convidados é que tinham um brilho diferente no olhar. Era aniversário da filha de um dos melhores professores que já tive, Marcus Vinícius. Agora, imaginem: docinhos, música infantil dos anos 80, gente bonita, receptividade, sensação de estar em família mesmo sendo apenas aluno do pai da aniversariante… Tudo isso junto me dá uma saudade daquele tempo. E acho que só vou sentir isso de novo quando estiver casado e com um filho completando 1 ano de idade.
 
Pois bem. Se eu consegui eleger o melhor, também consigo contar qual foi o pior aniversário de toda a minha vida. Michael Jordan errou feio quando me convidou pra ir àquela festa. Um bolo do Homem Aranha, que na hora em que foi servido veio mais com estampa do personagem do que com cobertura, um pessoal se arrumando de última hora, morcego nos pés de fruta. Agora, dizer que o aniversário foi ruim porque aconteceu no quintal seria injusto, até porque o de Belinha, a filha do professor, também aconteceu em uma área livre como a da festa dele. Mas que é o cúmulo deixar o rádio ligado na pior emissora da cidade a noite inteira só tocando forró e pagode, isso é. Custava comprar uns CD’s? Custava, visto que o aparelho que tocava esse tipo de mídia só veio chegar no fim da festa, quando eu já estava indo embora – graças a Deus. Sinceramente, eu espero que ele não leia esse texto nunquinha!
 
Pra terminar, queria falar do último “niver” em que fui. Nessa semana, uma das minhas melhores amigas, Isabel Moraes, fez 16 anos. Não teve todo aquele aparato, um monte de mesas cobertas com toalhinhas coloridas e nem uma porção de gente cochichando e fingindo se importar com quem está trocando de idade. Mas são exatamente esses os aniversários a que dou mais valor. As comemorações que só os amigos de verdade participam, as missas antes de um “coquetel” qualquer (que paradoxo!), as brigas pelo controle da TV, a falta de energia no melhor da festa, as idas à uma lanchonete em uma parte distante da cidade, as idas à uma pizzaria muito depois da data do aniversário, as conversas - na cama - com a namorada da aniversariante (nada ilícito)… Enfim, a presença sincera. Uma forma de dizer um Feliz Aniversário de verdade, sem sorrisos amarelos no rosto ou coisa parecida.
 
Mas se vier a uma comemoração minha, seja do que for, não me traga presentes. Traga um sorriso sincero e um abraço, que o resto eu dou um jeitinho de conseguir, mais cedo ou mais tarde.