quarta-feira, 22 de julho de 2009

Meu primeiro porre

O som antigo de Lobão ecoava por todo aquele local escuro e fétido. Todas as almas daquele lugar pareciam alcançar um estágio depois do transcendental. Era um barulho alto, um cheiro de bebida insuportável e a ardente vontade de se permitir ir além. Seis lances de escada pareciam separar a Terra do Inferno. E as luzes de um banheiro apertado anunciavam que ali algo de muito estranho aconteceria.
 
Uma janela entreaberta era a única alternativa para quem desejasse ver a noite. Aliás, como seria aquilo pela manhã? Será que todos os bichos se escondem e dão espaço à limpeza ou limpeza é o último substantivo pensável naquele plano? Eu não sei. Só sei que naquela sexta tudo que eu desejava era um gole do conhaque mais ardente. Eu precisava sanar toda a minha agonia, todos os meus escrúpulos de adolescente em um copo pequeno de bebida estranha.
 
Eu precisava também de uma mulher. Não uma mulher estranha que eu pudesse encontrar ali. Eu precisava de uma mulher estranha que me encontrasse naquele lugar e me fizesse perceber o quão bom e prazeroso era estar naquele Inferno. Eu precisava de pessoas. Não pessoas estranhas que eu encontrasse ali, mas sim pessoas estranhas que me levassem até aquele lugar e pudessem dividir comigo aquela agonia.
 
O primeiro gole era estranho, tão quanto aquele lugar. Sensações de desconhecido e reconhecido entrelaçadas, gosto amargo de algo inominável, risos e caretas. As línguas que insistiam em se tocar, o corpo que insistia em relaxar, a música que insistia em dominar a mente. Era tudo o que eu sempre quis, de um jeito que eu não sabia como seria.
 
O segundo era mais ameno. A sensação de tranquilidade já tomava conta de todo o meu ser. Era uma paz diferente, a paz de estar no Inferno. Os corpos começaram a se tocar, os olhos fitavam partes precisas daquela mulher e a vontade de ir além daquele além era crescente. O banheiro. Munido de toda a proteção aparente e com uma coragem que só a bebida pode dar, lá se foi aquele casal, não sem antes beber mais uma e tragar mais um outro. O empurrão na parede, a mordida no pescoço, as palavras sacanas e o fim de um tabu.
 
O tempo passava e tudo o que eu consigo me lembrar é que eu não me lembro de mais nada. Pessoas pareciam dar tchau, pareciam reclamar que já era tarde, pareciam me ajudar a descer do carro, pareciam me dar sermões e me jogarem debaixo do chuveiro, pareciam adormecer… O outro dia era consequencia. Nada mais importava. Era o meu primeiro porre, a minha primeira sensação de não ser aceito no céu e a minha primeira paz de espírito. Tudo ao som de um rock psicodélico, ejaculado na velocidade terrível da queda.

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2 comentários:

  1. A cachaça quase corrompeu sua ALMA .. O porre mais profundo e sincero que já ouvi falar na minha vida!

    xD

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  2. Se o tal do "Primeira Embriaguez de um homem" não fosse acerca da MINHA pessoa, esse texto seria o meu preferido sobre primeiros porres.
    Sou teu fã, cara.
    Beijão.

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