quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Mulheres e sapatos

Calçados ortopédicos eram a sensação aos 2 anos de idade. Ajeitar aqueles pezinhos tortos, fofos e desengonçados. A mãe andava feito louca pelas lojas infantis da cidade em busca do melhor modelo para sua pequena bebê. Chegava satisfeita, colocava na criança um vestidinho branco, uma meia rosa, o sapato recém-comprado e saía. Era seu troféu, sua preciosidade, frágil e linda.

Aos 10, só queria saber de botas. Não botas quaisquer; botas da moda. Calçados de sua personagem favorita da televisão. Uma bota cano longo, preta, com desenhos em relevo branco da boneca japonesa que invadia as casas de milhões de crianças todos os dias de manhã. Não era do gosto da mãe, mas fazia o gosto da filha. Satisfeita, a pré-adolescente ia ao cinema com as amigas mostrar a nova bota e tomar sorvete sem a mãe.

A debutante queria um salto que combinasse com aquele vestido rosa. Não podia ser um salto rosa – brega demais. Um prateado, algo de festa, que nenhuma amiga invejosa tivesse igual. A mãe saiu feito louca pelas lojas da cidade. Gostava de muitos, mas a filha de nenhum. O salto perfeito estava na loja mais cara do shopping e à mãe coube pagar. Para a garota, o cartão de crédito era um troféu, uma preciosidade, frágil e lindo.

Egressa de Direito, precisava de scarpins. Sapatos chiques, que demonstrassem seu poder perante a sociedade e naquela sala da faculdade particular. Jogou fora muitos saltos de festa, alguns deu pra mãe, outros doou pra filha da empregada. Conheceu seu futuro marido, que a presenteou com um lindo sapato chique. O papel de compradora de sapatos da mãe havia sido substituído.

Ficou grávida. A mãe viraria avó. A filha viraria mãe de uma linda menina. Em seu enxoval, a nova filha ganharia dezenas de coisas – vestidos, meias e, com certeza, sapatos. Sapatinhos fofos, ortopédicos, brancos... A nova mãe, vaidosa, não queria saber de andar por aí grávida e sem seus sapatos. O marido, dono de uma loja de sapatos, logo resolveu o problema. Deu um par de chinelos à esposa e disse:

- Ande, vá ser humilde. Pare de cobrir seus lindos pés com esse horror de sapatos.

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