domingo, 9 de junho de 2013

Batendo retratos

É que as fotos ficam. Na falta de máquina do tempo, inventaram a fotografia. Não dá pra voltar àquela festa do seu primeiro porre, mas dá pra sorrir bastante olhando aquela imagem registrada pelo V3 cor-de-rosa da sua melhor amiga. O namoro acabou, vocês nem se falam mais, mas provavelmente alguma foto do casal ainda está perdida no Fotolog conjugado, cuja senha nenhum dos dois lembra. Para os mais saudosistas, guardar um antigo álbum de família traz muito mais felicidade do que um almoço de domingo na casa da mãe.

Dia desses, minha madrinha de 92 anos jogou fora um álbum antigo sem nenhum motivo. Confesso que tentei entender o porquê daquela atitude, mas desisti quando vi que ela não se sentia mais à vontade vendo aquelas fotos. Compreendi que um dia a gente simplesmente se cansa de manter as velhas recordações. Os amigos se vão, os amores também e só resta você e aquelas folhas de papel 10x15 desbotadas pelo impiedoso tempo. Por enquanto, ainda não cansei. Espero que não me canse até o meu 100º aniversário.

As fotos têm um efeito analgésico. Elas não foram feitas para absorver lágrimas desmedidas após o fim de um ciclo. Esses retratos têm a finalidade de manter a memória viva, ligada ao 220 do sentimentalismo. À exceção das fotos tremidas, qualquer imagem registrada é válida. O sorriso do seu primeiro filho, a emoção da formatura na universidade, a viagem com os melhores amigos da escola. Quem se vai, perde a chance da próxima foto. Quem fica, tem a oportunidade de escolher o melhor ângulo e congelar o tempo, contrariando todas as leis da física e da saudade.

Geração nenhuma foi tão apegada à fotografia quanto a atual. Instagram, Tumblr, Flickr, Mobli, We Heart It... Negócios que se popularizaram por causa do nosso saudosismo e da vontade extrema de expor a todos o que nossos pais só mostravam aos amigos mais chegados. Ainda encontramos alguns amantes do mundo analógico, mas confesso que não dispenso a praticidade do digital ao meu alcance em um descompromissado clique. Coracionar virou moda. Fotografar virou estilo de vida.

Morar em uma cidade histórica tem suas vantagens. Final de tarde posando em frente a casarões, ruínas servindo de cenário para eternizar histórias de amor, o tempo como pano de fundo para a posteridade. Qualquer um é fotógrafo. E isso não é bom ou ruim. Como é incrível comparar o antes e o depois de um determinado local. Quantas histórias não foram desenhadas naquele lugar? Quantas pessoas passaram por ali? Envelhecer é possível quando estamos diante de uma fotografia?

Guardo muita coisa antiga em meus arquivos (digitais e físicos). De vez em quando, sinto saudade e vou lá fazer uma pequena viagem, sem custos, aborrecimentos ou overbooking. E me pergunto: o que seria de mim sem tudo isso? O passado importa a partir do momento em que te ajuda a ser alguém melhor. E o meu, com certeza, me ajudou a ser quem eu sou hoje. Triste daquele que não fotografa. Triste daquele que não eterniza um abraço, um sorriso, um beijo apaixonado. A mente uma hora cansa. A lembrança uma hora descansa. Repouse nas fotos e descubra o quanto você era feliz e não fazia a mínima ideia do que estava acontecendo. Fotografe!


domingo, 2 de junho de 2013

Quero!

Quero ser o teu escritor. Quero acordar às 3 da manhã de uma madrugada fria só pra rabiscar segredos na tua agenda velha. Quero espantar o mal que é não te ter por perto inventando a personagem mais onipresente que já existiu na história. Quero povoar teu mundo com vírgulas, exclamações, orações subordinadas e tudo mais que couber na nossa folha em branco. Te quero completa, sem jamais sonhar com um ponto final. Qualquer um me entenderia.

Quero ser o teu escritor porque eu simplesmente não saberia ser mais nada além de apenas isso. Médico, advogado, jornalista, apaixonado. Quero te acordar às 3 da manhã de uma noite quente só pra rabiscar minha língua no teu corpo. Quero renovar o bem que é te chamar de “meu bem” a cada ligação diária. Quero te chamar de "minha" mesmo que nossa aventura não dure mais que os atuais 500 anos. Quero ser o teu Pessoa, Drummond, Machado. Você me entenderia.

Quero escrever um livro. Te colocar como capa, dedicatória, nota de rodapé. Escrever teu nome a cada 637 palavras. Está ali, tá? Povoar as páginas ímpares com meus defeitos e as pares com tuas qualidades. Marcar uma sessão de autógrafos no teu lugar preferido dessa cidade idosa. Talhar nossos nomes na árvore mais antiga e deixar que a seiva da paixão escorra em direção ao chão, ora dominado por nossos pés, ora habitado por nossos corpos em movimento apaixonado. Quero descobrir nossa própria rotação. Translação. Os geógrafos me entenderiam.

Mas sabe o que eu quero de verdade? Teu sorriso a cada afago nesse cabelo cuidadosamente rebelde. Teu olhar de felicidade a cada sussurro musicado nesse ouvido de princesa. Teu abraço demorado a cada medo de me perder. Teu corpo curvilíneo, desenhado pra atender tuas necessidades e completar as minhas. Tua voz ecoando pela minha cabeça enquanto faço a primeira prova da disciplina mais empolgante da universidade. Só quero te ter por perto, entende? Sentir saudade imediatamente depois de te ter por um dia inteiro. Olhar tuas fotos nas redes sociais e perder toda minha concentração no trabalho. Responder uma mensagem de texto te chamando de amorzinho, de um jeito que só a gente e o pessoal do Porta dos Fundos entende. Alguém me entenderia?

Quero estar nos teus livros, teus discos, na tua roupa. Quero escrever a mais bela história de amor que já inventaram por aí. Quero estar na tua mente daqui a 50 anos. Quero ver o teu sucesso, acompanhar tua carreira, mimar teus filhos. Ou os nossos, quem sabe! Quero acordar desse sonho e te preparar um café da manhã especial feito com o ingrediente mais especial que possa existir: o amor. Quero ser o teu clichê, teu amante mais brega, teu eterno namorado. Eu te quero, guria. Como nunca quis ninguém nessa vida!


*'Quero' também é o título de uma das minhas poesias favoritas de Carlos Drummond de Andrade. Clique aqui para ouvi-la na voz do ator, já falecido, Paulo Autran.